Um copo azul está vazio
em cima da mesa, os dedos geométricos da mão direita estremecem ao
sentir o pulsar dentro do corpo. Por vezes acredita que o sangue
desistiu de correr pelas veias translúcidas. Não é o medo da morte
que invade a sua mente diaramente, é o fim do desejo de ser. A
reflexão bloqueia os seus movimentos, e empurra o corpo para uma
sucessão vazia de actos. Para quê prosseguir nas rotinas
empoeiradas se nada mais existe além da mesa de madeira gasta e a
cadeira que range a cada toque? É isto que ouve todos os dias.
Um acordar aos 70 anos
espelhado na ideia que o sol é velho. A luz não surge pela
imponência da coragem mas pela repetição mecância apoiada na
cobardia da lógica; hoje deito-me amanhã levanto-me. Acompanhar os
passos com os olhos torna estridente a miopia do passar do tempo.
Onde começa a secura da retina? Todo o exterior que é visível
agarra-se à sucessão das horas, assassinando ferozmente qualquer
possibilidade de juventude.
O copo permanece em cima
da mesa. As mãos envolvidas em ossos permanecem alertas à
possibilidade de movimento. Em cada um dos minutos que passam não se
lembra de como aquele azul esconde a possibilidade de matar a sua
sede. A ausência de líquido ilude a capacidade que tem de
alcançá-lo, preenchendo todo o vazio que estremece a cada ranger da
cadeira.